A cidade de Lisboa contava, em Dezembro do ano passado, com 852 sem-abrigo, na sua maioria homens, portugueses, solteiros e sem fontes de rendimento, segundo um levantamento cujos resultados foram apresentados pela Santa Casa da Misericórdia.
A operação teve a participação de mais de 800 voluntários que percorreram todas as ruas da capital e foi o culminar do trabalho desenvolvido pelo "Programa Intergerações | InterSituações de Exclusão e Vulnerabilidade Social" que, de Abril a Dezembro de 2013, contactou com 649 sem-abrigo, dos quais 454 responderam a um inquérito.
Na origem da situação de exclusão estão, na maior parte dos casos, conflitos familiares e relacionais, o desemprego e a doença física ou mental.
Dos 454 inquéritos feitos, conclui-se que 30,6% dos sem-abrigo está na rua há menos de 1 ano, 17% entre 1 a 3 anos e 15%, entre 3 a 6 anos. 5% encontra-se há mais de 2 décadas em situação de vulnerabilidade e surgiu 1 caso de uma pessoa que vive na rua há 40 anos.
87% dos sem-abrigo inquiridos são homens e têm entre 35 e 54 anos (48%), seguido pelo escalão 55-64 anos (20%).
A pessoa mais nova contactada tem 16 anos e a mais velha 85.
Os sem-abrigo inquiridos são maioritariamente solteiros (44,5%) e portugueses (58,4%), tendo sido registados 14,3% sem-abrigo pertencentes a outros países da União Europeia, alguns dos quais querem apenas um bilhete que lhes permita regressar a casa.
Quanto à educação, 1/3 concluiu o ensino secundário, técnico ou superior, 4,6% têm qualificações superiores e 7,7% não sabe ler nem escrever.
A grande maioria (71,8%) não tem actualmente qualquer fonte de rendimento e 68,9% recebe apoio na alimentação.
Muitos preferem também dormir na rua por considerarem que os centros de acolhimento nocturno não são adequados, quer pelo elevado número de pessoas seguidas, quer pelo "desfasamento de horário com as suas rotinas de higiene - levantam-se entre as 04:00 e as 07:00, mas estes espaços só abrem às 09:00 ou mesmo depois", indica a Santa Casa. Apenas 36,3% dos sem-abrigo recorre àqueles centros de acolhimento.
Dos inquiridos, 54,2% dizem ter filhos, mas 36,2% não mantêm contacto em eles. Contudo, 13,8% afirmam ter contacto diário ou quase diário e 66,8% tem contactos frequentes com outros familiares.
A nível de saúde, apesar de 45,2% ter problemas de saúde, a maior parte não frequenta regularmente o médico ou outras entidades promotoras de saúde.
Só 5% referiram ter apoio em cuidados primários ou na medicação, sendo os problemas de saúde oral, diabetes, doenças cardiovasculares, pulmonares e neurológicas e doenças sexualmente transmissíveis os mais comuns.
Dos inquiridos, apenas 15,4% revelaram sinais de desorganização mental, quase metade (48,5%) afirmaram nunca ter tido consumos aditivos de álcool (contra os 30,4% que ainda têm problemas desta natureza) e 63,9% disseram nunca ter consumido estupefacientes (face aos 8,8% que têm problemas a este nível).
Após a análise destes dados, a Santa Casa da Misericórdia lança o apelo aos organismos públicos e privados para concertarem "estratégias para mudar o paradigma de intervenção junto dos sem-abrigo, evoluindo da assistência para a reintegração social".
A Santa Casa sublinha, ainda, a urgência de se adaptarem as respostas existentes, "permitindo o acesso a cuidados de saúde e adequando os horários e serviços dos espaços de acolhimento às reais necessidades desta população".
Tendo a cidade de Lisboa uma população de 547.733 e sendo 852 os sem-abrigo, o que corresponde a cerca de 0,16%, nem se pode dizer que é muito, se não se tratasse de pessoas…
Saber a idade, o sexo, a situação relacional, a nacionalidade ou a escolaridade dos sem-abrigo, talvez não tivesse interesse, se não se tratasse de pessoas…
Saber das razões que levaram à situação dos sem-abrigo, talvez não fosse importante, se não se tratasse de pessoas…
Saber da existência de relações familiares ou simplesmente do abandono entre os sem-abrigo, talvez não valorizasse o inquérito, se não se tratasse de pessoas…
Saber das maleitas de saúde ou dos distúrbios psicológicos que percorrem os sem-abrigo, talvez não fosse conclusivo, se não se tratasse de pessoas…
Saber dos vícios e desvios dos sem-abrigo, talvez não fosse imprescindível, se não se tratasse de pessoas…
E para além dos sem-abrigo, há ainda os “com-abrigo”, mas sem nada, que dá no mesmo, porque se trata de pessoas…
Saber destes números, com gente dentro, só é importante porque se trata de pessoas…
E era bom que certo n.º de pessoas fizesse alguma coisa para este pequeno n.º de pessoas para serem um n.º menor…
"Home for homeless" está a reabilitar espaço abandonado, em Coimbra. Voluntários e sem-abrigo iniciaram trabalho há um mês.
Sem Abrigo, Uma questão social (no Facebook)
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