Vencedora incontestada das eleições de 22 de setembro, Angela Merkel tem de encontrar parceiros para formar governo. Seja qual for a coligação, vai ter de assumir o poder que agora cabe ao país.
“Abel e Caim” de Marc
Chagal
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Os alemães votaram. Os seus parceiros europeus podem respirar de alívio: o escrutínio já passou, apesar de tanto os intervenientes como os observadores aguardarem ainda a fase mais apaixonante: a constituição de um novo Governo em Berlim.
As tensões decorrentes da questão de saber quem irá tomar as rédeas da política no centro da Europa não são injustificadas. São fruto dos acontecimentos e das experiências de 4 anos, marcados pela crise das dívidas públicas europeias, por um clima de preocupação quanto à sobrevivência da união monetária e pelo debate sobre as medidas a aplicar para garantir a continuidade do euro. A Alemanha desempenhou um papel fundamental nesses acontecimentos e experiências; um papel que muitos qualificam de “decisivo” e de “dominante”.
O mínimo que se pode dizer é que isso não deixou propriamente encantados os países do Sul. A Alemanha insistia na necessidade de consolidar as políticas orçamentais e colocava a adesão às suas próprias preferências políticas como condição para o desbloqueamento dos fundos de ajuda – que era igualmente um condição indispensável para que a maior parte dos alemães, que já se encontravam mentalmente numa posição defensiva, não se desviassem politicamente da Europa. O lugar central de Berlim é hoje mais flagrante que nunca, desde a queda do Muro.
Cultura de contenção
Apesar de já ser claro, o domínio económico da Alemanha tornou-se ainda mais evidente na sequência da crise. As tensões decorrentes dessas diferenças de desempenhos económicos e tecnológicos não irão atenuar-se, ou quase não irão atenuar-se, mesmo quando os países em dificuldades perseveram na via das reformas. Nesse período de gestão da crise e de destabilização da União, o seu peso económico, a sua posição geopolítica central e a política que aplica valeram à Alemanha dois rótulos: o primeiro é o de “país indispensável no seio da UE”, o segundo é o de “potência hegemónica hesitante”.
Teve de ser o ministro dos Negócios Estrangeiros polaco a proclamar que a Alemanha era “indispensável” e a apelar, aludindo ao estilo do governo federal, a uma governação dinâmica. Considerado por alguns como uma censura e por outros como um convite premente ao salvamento da Europa – de maneira desinteressada, ou quase – o qualificativo de “potência hegemónica” resulta sobretudo do domínio económico do país. Acontece que os alemães não podem nem querem ser uma potência económica internacional como foram os Estados Unidos, no século XX.
É óbvio que a classe política alemã não ignora que o país deve assumir mais responsabilidades políticas, tanto a nível europeu como a nível internacional. Contudo, uma parte dessa classe política continua presa a uma “cultura de contenção”, originária da Alemanha Ocidental, no que se refere às questões militares e de segurança. E, diga-se de passagem que, nesse aspeto, está em perfeita sintonia – como aconteceu no caso da Líbia – com uma grande maioria da população, que evoca de bom grado o modelo de uma “Suíça alargada” em matéria de política de segurança. O slogan “Germans to the front” (alemães para a frente) é bom apenas para os filmes históricos.
Responsabilidade política
O desequilíbrio entre os desempenhos económicos alemães (e a verticalidade que deles resulta nas questões que lhe estão associadas) e o discurso em matéria de segurança, que destaca frequentemente todas as operações em que a Alemanha não participará, não pode ser perturbado. A responsabilidade política da Alemanha na Europa decorre da sua situação no centro da União.
Contudo, essa responsabilidade não deve continuar a resumir-se apenas através da palavra de ordem “mais Europa”. As instituições europeias já não beneficiam à partida da confiança “apolítica” de todos os alemães. E, tal como a maioria dos seus parceiros, estes não sentem desejo de rever os tratados. No entanto, esses mesmos parceiros podem ter a certeza de uma coisa: no futuro, a Alemanha recordar-lhes-á que, no mundo híper competitivo de amanhã, a prosperidade da Europa dependerá do seu dinamismo, da sua capacidade de inovação e da sua competitividade.
Após a votação - Reformas, mas com quem?
“Angela Merkel está na defensiva” escreve Die Welt no dia seguinte às eleições legislativas do dia 22 de setembro. Para o diário alemão,
depois deste triunfo eleitoral, a chanceler já não tem nada a perder. Deverá utilizar os próximos anos no poder para executar reformas na Europa e no seu país. Os alemães gostam de Merkel por ser discreta e fazer o seu trabalho sem narcisismo e sem incomodar os seus compatriotas. Mas será suficiente?
“Angie” pode, de facto, formar um Governo, mas “Quem ainda quererá formar uma coligação com Merkel?”, interroga-se o Stern, uma vez que a chanceler tem o hábito de destruir os seus parceiros de coligação:
A grande coligação de 2009 assinalou a queda dos sociais-democratas [SPD]; em 2013, custou aos liberais [FDP] a sua existência no Parlamento. Seria, portanto, um grande desafio para o SPD convencer os seus militantes a aderir a uma nova grande coligação. Mas é a solução mais provável, face à maioria vermelha-verde no Bundesrat [câmara alta].
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