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sábado, 28 de setembro de 2013

A história aberta e maculada de um país idolatrado…

As recentes revelações sobre o registo de ciganos na polícia levanta o véu sobre as perseguições que sofreram e as discriminações atuais. Põem em questão o modelo sueco de integração e a imagem que os suecos têm do seu país.
Em janeiro de 2011, o ministro [sueco] da Integração, Erik Ullenhag, decidiu publicar um “Livro Branco” sobre “atentados e agressões contra os ciganos, na Suécia, no século XX”.
Durante a apresentação, Erik Ullenhag não esteve com rodeios: “Ao longo da história, os ciganos foram vítimas de agressões inaceitáveis, tais como a esterilização forçada e a privação do direito à educação para as crianças. Se quisermos avançar, é importante pôr um ponto final nisso e o Estado reconhecer as injustiças cometidas”.
Sinceramente, o que sabem os suecos dessas injustiças? Qual é o nível de conhecimento da opinião pública sobre este assunto?
Não melhora pensar que as informações sobre o assunto são escassas. Acrescente-se a isso que os preconceitos – e o ressentimento – contra os ciganos se espalharam assustadoramente em toda a Europa. Em países como a Hungria, milícias de cidadãos assassinaram ciganos, perante a indiferença da polícia. Noutros países, os ciganos são vítimas de uma discriminação virulenta em termos de mercado de trabalho e de aquisição imobiliária.
Registo de crianças de 2 anos
É neste contexto que temos de analisar as revelações do jornal Dagens Nyheter sobre os registos da polícia sobre os ciganos, na Suécia. Mais uma vez, um grupo vulnerável volta a sentir a desconsideração de que é vítima.
É difícil imaginar uma explicação plausível para o registo na polícia de crianças de 2 anos. A não ser que a polícia sueca queira ver o pecado original estampado na lei! Nesse caso, o delito surgiria quando? Quando os pais utilizaram um nome de família ao acaso? Erik Ullenhag parece ter boas razões para adiar a publicação do seu “Livro Branco”...
Nos últimos anos, foram publicados poucos livros, mas particularmente incisivos, sobre os capítulos mais sombrios da história da Suécia. Para lá da crueldade das histórias que contam, os seus autores têm em comum revelar uma sociedade que prefere evitar complicar as coisas para o seu país. Porque a verdade é que um país pode avançar pelo caminho certo e pelo errado ao mesmo tempo. Ou, nas palavras da escritora Lawen Mohtadi, em entrevista ao Sydsvenskan: “O modelo sueco estava em ascensão, assestado à igualdade. E ao mesmo tempo, fazia-se isto”.
Por “isto”, Mohtadi Lawen subentende o tratamento dado aos ciganos. Subentende a Comissão de Inquérito sobre a Vadiagem, que descrevia os ciganos como uma ameaça, em 1923. Subentende o facto de os ciganos terem sido impedidos de entrar em solo sueco de 1914 a 1954. Os ciganos que sobreviveram à II Guerra Mundial não puderam, pois, entrar neste país.
A Suécia e o “censo de vadios”
Em 1943, a Suécia realizou um “censo de vadios”. Lawen Mohtadi retrata-o deste modo: “No meio do fogo da II Guerra Mundial, com os ciganos a serem enviados aos milhares para os campos de extermínio nazis de toda a Europa, os ciganos da Suécia receberam a visita de polícias fardados, a pedir-lhes para indicar a sua etnia e a dos pais, e para fornecerem uma série de informações pessoais e íntimas”.
Quem quiser saber mais sobre o tratamento dado aos ciganos na Suécia, pode ler também o relatório público “A casa de vidro amarelo e azul”, publicado em 2005. Constata, nomeadamente, que a pena de morte foi introduzida em 1637, para “boémios e ciganos [do sexo masculino] que não saíram do país”.
A Suécia de 2013 não pode ser comparada, naturalmente, com a Suécia do século XVII. Também não temos equivalente para a “biologia das raças”, que estava em voga no país no início do século passado. Mas não podemos igualmente agir como se estes capítulos nunca tivessem sido escritos, sob pena de nunca sermos capazes de analisar e combater o racismo contra os ciganos que existe hoje. Precisamos que a polícia e as autoridades entendam isso. É a condição para a confiança no Estado de Direito.
“Os ciganos foram registados em ‘Z inteiro’”, afirma a manchete do Dagens Nyheter, que revela vários pormenores sobre o registo dos ciganos pelas autoridades suecas: o Livro Branco do Governo sobre a forma como são tratados os ciganos na Suécia, que deverá ser publicado em 2014 e a que este diário teve acesso, indica que, entre 1959 e 1996, as autoridades, e em especial o município de Estocolmo, procederam ao registo de “centenas, talvez milhares” de ciganos.
Considerados, no início do século XX, como “parasitas sociais” que “degradavam a raça sueca”, os ciganos viram ser-lhes vedado o acesso ao território sueco até 1954, explica o jornal. O levantamento da proibição foi acompanhado pela identificação, pela polícia, de “todos os ciganos do país, incluindo mestiços, sedentários e nómadas”, tal como estipulado numa diretiva do Governo.
Em Estocolmo, a partir de 1959, essa tarefa foi atribuída a uma “secção cigana”, que registava e avaliava os ciganos. Todos os aspetos da sua vida eram examinados: inteligência, aproveitamento escolar, higiene e comportamento. […] Cada indivíduo e cada família eram registados sob o ‘número-Z’ – sendo o “Z” a primeira letra da palavra “zigenare”, cigano em sueco. As pessoas inscritas no registo e os respetivos parentes eram, em seguida, subclassificados como “Z inteiro”, “½ Z”, “1/4Z” e “não Z”. Estes códigos foram também utilizados, até 1981, pela Direção Nacional de Saúde e dos Assuntos Sociais.
Inicialmente, explica o Dagens Nyheter, a intenção era benigna: os ciganos perseguidos e que viviam na pobreza passavam a ter direito ao alojamento e à educação. Mas havia igualmente o desejo das autoridades de vigiar os ciganos e de os incluir no registo, apenas por causa da sua etnia.

2 comentários:

  1. há um aspecto que acrescentaria : a dificuldade em obter colaboração dos proprios sobres as ajudas propostas. Por experiencia propria arranjei emprego para o homem e apesar do negocio de roupas estar a não dar nunca se mostrou interessado. claro que depois de varias ajudas em generos e dinheiro a "vontade" de ajudar sem retorno esmorece. A falta de cabeça será ogarnde erro.

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    1. Mas aqui é um sinal claro de perseguição e discriminação, embora no passado recente, vinda de um país que todos julgávamos irrepreensível no campo social...

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