Portugal está a caminhar na direcção
certa, mas isso não chega para ter a certeza de que o seu plano de ajustamento
vá resultar. Quem o diz é o economista Nouriel Roubini, conhecido pelas suas
previsões económicas pessimistas, que discursou ontem no "European Day", que decorre em Wall Street, Nova Iorque. "Portugal tem vindo a fazer as suas
reformas estruturais, mas está a sofrer de fadiga da austeridade, e isso começa
a ver-se nas ruas", afirmou o economista.
Roubini destoou do tom optimista que marcou a conferência, na qual Portugal foi apresentado como exemplo de um processo de ajustamento bem-sucedido.
Falando sobre a redução dos défices comerciais, que é usada pelos defensores da austeridade para sublinhar o sucesso destas políticas, o economista disse que “a redução é estrutural apenas em parte”, pois a “maior parte dessa redução resulta do colapso dos mercados internos, que estão em recessão”.
Roubini admite que “a austeridade é necessária”, mas diz que o seu efeito recessivo tem de ser considerado e que os seus critérios de aplicação devem ser melhor definidos. “Muitas medidas de consolidação têm efeitos recessivos. As reformas estruturais, que são necessárias, também têm efeitos recessivos. Por isso, deve reduzir-se a austeridade fiscal quando se fazem reformas estruturais”, explicou.
O economista defende que há uma separação entre o que se passa nos mercados financeiros, que têm tido bons desempenhos devido à existência de liquidez, e a economia real. “Este desequilíbrio não pode continuar para sempre. As forças da gravidade económicas vão forçar uma correção (...) Ainda não existe uma bolha financeira, mas se esta situação continuar, dentro de 1, 2, 3 anos há a possibilidade de um crash”, defendeu. Ainda assim, Roubini admite que “a situação na Europa melhorou significativamente”.
“Há um ano estávamos todos preocupados com o fim da zona euro, isso hoje já não acontece”, disse, enunciando vários motivos, entre os quais uma mudança de discurso em Bruxelas e Berlim e o lançamento do Programa de Transações Monetárias Diretas e do Mecanismo Europeu de Estabilização Financeira.
O comissário europeu do Emprego, László Andor, afirmou que a atual crise demonstrou que a austeridade pode ter sido a resposta necessária a curto prazo, mas piorou a situação e não pode ser a solução para o futuro. Contudo, defendeu que "muitos Estados-membros" ainda precisam de consolidar os seus orçamentos e sublinhou a importância de "melhorar o 'design' da UEM, com mais solidariedade" entre os 27.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) anunciou que a maior economia do euro, a Alemanha, não se deve exceder na consolidação orçamental, o mesmo é dizer que o país deverá “evitar excessos” no que toca à austeridade, isto porque, ao contrário de Portugal, o seu desempenho orçamental está melhor do que o previsto.
Diz Roubini que vamos na direção certa, mas que não há garantia de que a coisa vai dar resultado (para os cidadãos, pensamos todos), o que não parece muito coerente, embora contrariasse os restantes oradores, que apontaram Portugal como exemplo de bem-sucedido (para os especuladores, pensam eles)…
E tudo isto é ainda mais contraditório, quando reconhece que estamos a sofrer de fadiga da austeridade, que se vê nas ruas, sem imaginar o que poderia ver nas casas (dos cidadãos)…
E começamos a ficar com a dúvida sobre o que significa “sucesso” e quem dele beneficia, porque todos os indicadores penhoram o futuro do país, enquanto o quotidiano dos cidadãos piora a cada promessa de melhoria, sempre adiada…
E esta dúvida cresce (ou esclarece-se) com a constatação de Roubini, quando diz que muitas medidas de consolidação (vulgo, austeridade) têm efeitos recessivos (vulgo, mais pobreza), bem como as reformas estruturais (vulgo, baixa de salários e mais desemprego), também têm efeitos recessivos (vulgo, mais pobreza), acabando por reconhecer que os mercados financeiros vão de vento em popa, em detrimento da economia real, que vai de mal a pior e a continuar assim, mais ano menos ano, teremos um crash… Então o que é que produz riqueza?
Mas tenhamos calma, que a Europa (num estado terrível) melhorou bastante, apesar de os cidadãos terem tido mais do que uma recaída (retificativa) por ano, estando agora eles numa situação terrível…
Por outro lado, vem o comissário europeu do Emprego dizer (só agora?) que a austeridade piorou a situação e não pode ser a solução para o futuro, embora por cá o futuro seja mais do mesmo, sugerindo que para além da austeridade é preciso melhorar o desenho (o do Gaspar), com mais solidariedade (mais dinheiro, menos juros e mais tempo) entre os 27… Isso é que era bom?
Entretanto, ficamos a saber, que na Alemanha também se pratica austeridade (por isso as desigualdade cresceram brutalmente durante a crise), o que justifica uma das maiores contestações no “1 de junho”, em Frankfurt - 5.000 pessoas protestam em Frankfurt contra a troika -, por estarem também a ser espoliados, com a justificação (oficiosa) de estarem a contribuir para a “siesta” dos sulistas…
No fim desta lengalenga toda, vem a Standard & Poor's, uma das más da fita, dizer que “autoriza” que a “consolidação orçamental” seja aliviada, que ninguém será punido por isso. Ninguém, quer dizer, os países, os bancos e as grandes empresas, porque o cidadão não vê nada e daí as dúvidas…
As dúvidas serão sempre, para nós, uma certeza, quanto mais falam, mais cortam, mas tudo há-de melhorar, nunca se sabendo para quem…
Não é a dúvida metódica, é a dúvida do método da dívida…
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