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domingo, 31 de março de 2013

Mais uma exposição de Isabel Lhano, para sentir e ver

o belo ético - valter hugo mãe
ia e voltou
à boca do ar
com a boca a brilhar
de alegria
Mário Cesariny
Isabel Lhano - Foto: Rita Rocha
por várias vezes escrevi sobre o trabalho da isabel lhano. percebo agora que, como pessoa da minha mais preciosa intimidade, talvez tivesse feito sentido dizer logo à partida que a arte dela é a de ser gente. a pintura é apenas uma pista para algo muito maior, isso da sua muito genuína personalidade que não lhe permite máscaras e que tem que ver com a ansiedade pela urgente salvação do mundo. a urgente sensibilização do mundo. há gente que pensa que a isabel comeu tantos morangos na infância que ficou com cabelo vermelho, também podemos pensar que, por ter tanta pressa em pôr mãos à obra, pintando quadros e cartazes, não teve tempo para crescer mais e ficou assim baixinha. ela tem a voz rouca porque certamente gritou bastante contra as crises e contra as hipocrisias. com as suas histórias e heranças, a isabel lhano é uma exceção entre as pessoas, escolhida pela natureza para ser intensificada, dedicada, fabulosa.
a arte da isabel lhano é eminentemente ética. a sua pintura busca avidamente uma aposta no humano, idealmente julgando que o convívio com a harmonia e beleza inequívocas leva à sedução para os afetos, leva à formação de gente imbuída de melhores impulsos para se chegar a um mundo melhor. estamos no território das utopias, é certo, que no caso da isabel ultrapassam a sua magnífica capacidade para a representação do corpo e se definem por essa glorificação do humano através da elevação da sua imagem a uma expressão artística quase sagrada.
há uma intenção cândida, muito fora de modas, que tem na delicadeza destas imagens um discurso de combate. o que a isabel propõe é sempre o deslumbre para ressaltar valores que antagonizem a pulsão para destruir. o que procura fazer é invariavelmente mostrar o melhor do afeto para colocar o assunto no centro do mundo e não permitir que outro valor se coloque maior do que esse. daqui decorre a sacralização. não uma ligação com o sublime transcendente, mas uma fixação com os valores de uma realidade que se efetiva no trato entre os homens. as pessoas como lugar absoluto, com sua justificação e suficiência.
é interessante perceber que, ao longo dos anos e das fases, a isabel sempre pesquisou essa maravilha que é o outro, o desconhecido ou não, colocado na tela como objeto de admiração, diria, colocado como o objetivo. o seu objetivo é o outro. as suas telas adoram-no, expõem-no na sua própria e sempre magnífica identidade. isso já é claro em todo o tempo em que escondeu os rostos às figuras retratadas e tornou-se mais óbvio quando assumiu a longa coleção de retratos da gente dos seus afetos pessoais. de algum modo, esta gente do seu universo pessoal esteve sempre em causa, pois, de entre estas pessoas escolheu os seus modelos e com estas pessoas imaginou o mundo melhor pelo qual se debela.
esta é uma forma de participar. é como escolhe, ou como foi escolhida pela natureza, comunicar a sua urgência para uma harmonização e equilíbrio que permitam a pacificação de todos. é muito interessante perceber que, depois de tantas abordagens, os últimos trabalhos da isabel pareçam ir ao encontro do mais vulnerável e íntimo das figuras representadas. não é estranho que assim seja, o resultado do que vemos nos quadros da isabel inspira sempre ao íntimo, mas agora parecem desembocar na ideia de pacificação, um quase retrato uterino, com as figuras no espaço da cama, símbolo do envolvimento aquático do ventre, símbolo do renascimento de cada dia, símbolo do amor. e o amor é sempre construção. o gesto é desarmado, quase sempre contido, sincero. as suas figuras são entendidas e mostradas pela sua dimensão mais sincera.
já muito falei da capacidade técnica da isabel. o impressionante efeito de realidade que imprime, a volumetria, a proporção e a composição, a inteligência no uso da cor. passo por cima do protocolo para dizer que as figuras da isabel surgem de modo direto, o pincel imediatamente desenhando, sem lápis, sem desenho prévio, apenas o gesto já pintor que estabelece na tela uma imediata aproximação ao resultado final. não há projetores, decalques, papéis vegetais, não há esboço, não há hesitação. os quadros da isabel lhano são exímias provas da capacidade natural para a representação pictórica. por causa disso, também há quem pense que os olhos e as mãos da isabel vieram de krypton, o planeta do super homem.
no café, costumamos esperar que a isabel flutue. em algumas noites, creio, alguns de nós já vimos perfeitamente a isabel fazer magias mais complexas do que flutuar no ar. andamos todos a ver se aprendemos com ela. é a verdade. procuramos aprender com ela todas as coisas.
Demasiado espaço entre nós

De 23 de março a 28 de junho   

Supressão mútua

Tulipa

Papoila

Lírios

Gengibre

Juncos

Infiltração

Caule

Vórtice

Muro

Fusão

Telhado

De mãos abertas para te prender

Fazemos o calor

Fazemos o frio

Concha

O teu corpo é um lugar de ver

A partir de ti todos os caminhos

Abraço

Chegada

Pôr-de-face
Sinto-te o coração
E eu estive na abertura e bem acompanhado (eu sou o desconhecido), gostei e aconselho...
Foto de José Carlos Marques

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