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segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

As ideias feitas sobre a Dívida de Portugal são falácias!

"É falso que sem aquela ajuda não havia dinheiro para pagar pensões e salários aos funcionários públicos até final do ano" de 2011, sublinhou José Maria Castro Caldas, professor de Economia e investigador do Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra.
Portugal não tinha dinheiro para "amortizar a dívida pública que vencia nessa altura e a ajuda da 'troika' veio para pagar aos credores, exceto 13 mil milhões de euros" destinados a "recapitalizar a banca" portuguesa, sustentou o economista, num debate promovido pela Auditoria Cidadã à Dívida Pública Portuguesa (IAC).
"Existem ideias feitas sobre a dívida" de Portugal que "não correspondem à realidade", frisou Castro Caldas, considerando que "a maioria das pessoas acredita que os 78 mil milhões de euros da 'troika' eram para pensões e salários".
Discordando de alguns participantes no debate, que defenderam que a dívida pública portuguesa não deve ser paga, Castro Caldas disse que "há uma parte da dívida" que deve ser paga, designadamente, ao Fundo de Segurança Social, aos pequenos aforradores que investiram em Certificados de Aforro e à banca portuguesa.
Uma parte da dívida não deve ser paga, como a que resulta de "contratos ilegítimos" e "a outra parte deve ser renegociada", advogou.
O “resgate” a Portugal, que nós estamos a pagar da forma que se sabe, é o resgate de bancos europeus que emprestaram acima das suas possibilidades.
José Maria Castro Caldas
Não sabemos em detalhe quem detém os títulos da dívida pública portuguesa. No entanto, as estatísticas europeias dão-nos indicações da identidade dos credores por grandes agregados: empresas não-financeiras residentes (empresas sediadas em Portugal), empresas financeiras residentes (bancos, companhias de seguros e fundos financeiros sedeados em Portugal) e resto do mundo.
Infelizmente “resto mundo” é demasiado vago. No entanto, a partir de dados disponíveis na página do Instituto de Gestão do Crédito Público (IGCP) podemos discriminar a dívida ao Fundo Monetário Internacional (FMI), Mecanismo Europeu de Estabilidade Financeira (MEEF) e Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF). Se tirarmos do “resto do mundo” as parcelas respeitantes ao FMI, MEEF e FEEF ficamos com um agregado “outros não residentes” que inclui empresas financeiras, não financeiras e famílias estrangeiras.
O gráfico seguinte representa a evolução destas parcelas entre 2002 e 2011 (últimos dados disponíveis).
Podemos constatar nesse gráfico que, de 2002 a 2008, o peso entre os credores do Estado português das empresas, bancos e fundos de investimento estrangeiros foi sempre superior a 50% e se foi acentuando, chegando aos 75%. A partir deste ano – o ano da grande crise financeira – os investidores estrangeiros foram abrindo mão dos títulos portugueses. Em final de 2011 já detinham menos de 50%.
O peso entre os credores do Estado português dos particulares residentes (famílias portuguesas) que era relativamente elevado em 2002 (25%) foi também diminuindo ao longo do período, situando-se em 5% em 2011.
Em contrapartida, aumentou o peso dos bancos, companhias de seguros e fundos de investimento portugueses e, em 2011, surgiram os fundos europeus e o FMI como grandes credores de Portugal.
Em 2011, o FMI e os fundos europeus detinham 19% da dívida e prevê-se que venham a deter 34% em 2012 e mais de 50% em 2014. Em 2012 cerca de 70% da dívida pública portuguesa será detida pelo FMI, os fundos europeus e o sector financeiro português e em 2014 esta percentagem poderá chegar aos 80%.
Significa isto que ao longo da intervenção da troika os credores privados internacionais terão passado de uma situação, em 2008, em que detinham 75% da dívida portuguesa, para uma outra, em 2014, em que deterão apenas 20%. De 2008 a 2014 os credores privados internacionais ter-se-ão livrado dos títulos de dívida pública portuguesa.
Para isso mesmo pode ter servido a intervenção da troika: para limpar os balanços das instituições financeiras estrangeiras (sobretudo europeias) de títulos da dívida portuguesa tornados demasiado arriscados. Para onde transitou o risco? Para os fundos europeus e o FMI, isto é, para os cidadãos dos países da eurozona que estão a garantir as emissões de títulos destes fundos destinados aos empréstimos a Portugal.
Na realidade o “resgate” a Portugal, que nós estamos a pagar da forma que se sabe, é o resgate de bancos europeus que emprestaram acima das suas possibilidades.
A troika veio salvar-nos e o governo alemão tem todo o direito a fazer-nos todas as exigências, já que nos resgataram. É esta a ideia em que se baseia a nossa subserviência. Mas vale a pena olhar para os números e reter o conteúdo do texto acima, do economista José Maria Castro Caldas.
Como muitíssimo bem conclui Castro Caldas, a intervenção externa serviu, antes de tudo, "para limpar os balanços das instituições financeiras estrangeiras (sobretudo europeias) de títulos da dívida portuguesa tornados demasiado arriscados". E esse risco foi transferido para os cidadãos da zona euro, através das instituições financeiras públicas.
Ou seja, o FMI, o BCE e a Comissão Europeia garantiram um resgate aos bancos alemães e franceses (sobretudo estes) que, descapitalizados, precisavam de se ver livres de todos os credores de maior risco. Não salvaram Portugal, assim como não salvaram a Grécia. Salvaram os bancos dos países do centro da Europa. Os europeus pagaram com a assunção do risco. Nós pagámos com a austeridade.
Os bancos dos principais promotores destes "resgastes", que se livraram, através de dinheiros públicos, dos riscos dos seus próprios investimentos, é que se salvaram. Sim, os contribuintes alemães têm de que se queixar. O seu dinheiro tem servido para salvar dos investimentos que fizeram a banca dos seus países. Assim como os nossos sacrifícios.

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