(per)Seguidores

sábado, 21 de setembro de 2013

Um "'megapartido' único" levará eleitores à abstenção?

Nas eleições legislativas alemãs, pode vir a assistir-se a um novo recorde de abstenção. Aos tradicionais refratários, acresce um novo tipo de objetores, mais elitista, que inscreve a abstenção nos costumes, lamenta o “Spiegel”. Excertos.
A sede do movimento, em Colónia, na Mittelstrasse, é uma sala branca e despojada, 20 m2 onde não há nada a não ser um punhado de folhetos. No entanto, o cartaz pendurado por cima da porta da entrada revela grande profundidade de pensamento e prevê nada menos que o advento de uma nova era: “O gigante adormecido desperta”. O gigante adormecido é a abstenção e o homem que pretende despertá-lo chama-se Werner Peters, presidente do “Partido dos Abstencionistas”.
Werner Peters é um intelectual. Escreveu livros e promove regularmente tertúlias filosóficas. Fundou o seu partido há já 15 anos, e procura apontar as falhas da democracia multipartidária. Durante todo esse tempo, foi praticamente ignorado, para não dizer ridicularizado. Mas, aos 72 anos, sente que os ventos estão a mudar no país. “Constato que as minhas ideias estão a penetrar”, regozija-se. “É chegada a hora.” Neste tom um pouco de seita ou de testemunha de Jeová, o movimento pode, contudo, manifestar o seu gigantismo no próximo domingo.
Taxas de participação baixaram
Como já aconteceu em 2009, o número de abstencionistas pode exceder o número de eleitores do partido vencedor. O diretor do instituto de sondagens Forsa, Manfred Güllner, aponta o risco de haver uma taxa de abstenção recorde. “É de temer que só menos de 70% dos eleitores vão às urnas. Poderíamos considerar que serão eles os verdadeiros vencedores do escrutínio, se não fosse ao mesmo tempo um revés para a democracia”.
[Em tempos], votar era uma questão de honra. Após o colapso político e moral da era nazi, os alemães queriam aparecer como democratas “modelares” – aos olhos dos estrangeiros, mas também aos seus próprios. Estavam decididos a não perder a sua 2.ª oportunidade, depois de terem estragado a primeira, na República de Weimar, com as trágicas consequências que se conhecem.
No entanto, o abstencionismo não é um fenómeno novo na Alemanha. Após as primeiras décadas de assiduidade cidadã, as taxas de participação começaram a baixar de forma insidiosa – até chegarem aos 70,8%, nas legislativas de 2009. Entre os abstencionistas, contavam-se sobretudo pessoas pobres e com fraca instrução, que há muito se distanciaram do discurso político, acusando os “lá de cima” de serem responsáveis da sua desdita. Mas também participam antigos eleitores fiéis, amargamente dececionados com o seu partido preferido, mas sem coragem para experimentarem outro. É o caso de muitos ex-eleitores do SPD que se mantiveram afastados das urnas após as reformas iniciadas no âmbito da Agenda 2010.
Novo tipo de abstencionista
Entretanto, assiste-se ao surgimento de um terceiro grupo, que dá uma nova dimensão, essencialmente qualitativa, à abstenção. Nasceu um novo tipo de abstencionista. Tem instrução, frequentemente sem dificuldades económicas, saído das camadas superiores da sociedade. Este novo objetor não tem vergonha e estampa a abstenção no peito. Apenas 7% dos abstencionistas, sondados pelo Instituto Insa para o Bild, enfrentaram críticas de amigos e familiares. Assim, a desconfiança em relação à classe política e aos partidos está hoje instalada nas camadas superiores da sociedade alemã.
O presidente do Bundestag, Norbert Lammert, fala de um novo tipo de “snobeira da abstenção”. Os “snobs” em questão não vivem dos apoios Hartz IV [subsídios de apoio social alemães], não acusam a classe política e a sociedade de lhes entravar o caminho. Comparecem às iniciativas do filósofo, passam a maior parte do tempo em estúdios de televisão e usando camisas muito desabotoadas.
O filósofo Peter Sloterdijk declarou, recentemente, com a maior seriedade, que não sabia a data das eleições. “Até agora, ser politicamente responsáveis significava votar no mal menor. Mas como agir quando já não sabemos onde está o mal menor?”, pergunta ele, para justificar o seu abstencionismo. Entretanto, o colega, Richard David Precht, explicava que esta eleição “é seguramente a mais insignificante da história da República Federal”. Aquilo que finge ser um grande questionamento intelectual não significa senão: “São todos uns imbecis. Menos eu”.
Ausência de polarização
O abstencionista “snob” acha-se melhor democrata; pelo menos, melhor do que os partidos e seus representantes, de uma inquebrantável mediocridade. E levantam as sobrancelhas, horrorizados com os temas de campanha. Querem discutir grandes questões e denunciar a falta de visão. Richard David Precht fala de “campanha de pacotilha”; lamenta a “ausência de filosofia na política” e a “perda geral de capacidade de se projetar na Utopia”. Também lastima o nivelamento dos partidos e a existência presente de um único “megapartido”, empenhado na “defesa do meio ambiente e da Europa, na educação, família, filhos e saúde”.
É verdade que o tempo presente se distancia das grandes batalhas ideológicas do passado, como se vê pelos programas dos partidos. Seria também desejável que a oposição avançasse contrapropostas fortes sobre questões fundamentais, como o futuro da Europa ou a transição energética. E, evidentemente, seria bom que a chanceler não estivesse tão determinada em esquivar-se aos debates internos. A democracia vive do confronto de ideias, tão mais fecundo quanto mais diferentes forem as ideias e penetrantes os seus representantes.
Mas a ausência atual de polarização justifica uma tendência crescente para os eleitores se tornarem meros consumidores desejosos que a política “lhes proponha” alguma coisa, em vez de se informarem da oferta política existente? Podemos admitir que Angela Merkel tente adormecer os cidadãos. Mas isso não é razão para nos deixarmos embalar no sono.

2 comentários:

  1. Reflectindo na camara daqui que conseguiu maioria absoluta com 19% legitima- porque abstençao foi de 63%= Temo que para alem da falta de transparencia na gestão do dia a dia e da "fantasia" dos programas eleitorais, tenhamos que solucionar a possibilidade de um completo idiota com paleio ser eleito(não foi já?). O sistema finlandes parece-me atraente e digno de analise com opinioes diversas contraditorias. Os eleitores a voarem com fé tipo fatima ou clubista só pode ser um arremedo pouco racional de democracia.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. O problema, é que com os partidos cada vez mais iguais um aos outros, acabamos por construir um "megapartido" único, e tanto faz votar num ou noutro, porque é tudo igual ao litro, independentemente do sistema eleitoral...

      Eliminar