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domingo, 8 de setembro de 2013

A Europa de amanhã é… a Suíça!

A única maneira de a União Europeia poder ganhar legitimidade entre os seus cidadãos e manter um papel fundamental na política económica global é transformar-se numa união federal real, com base no modelo do seu pequeno vizinho, como pensam algumas das principais figuras políticas da Europa, reunidas no grupo de reflexão Berggruen. Excertos.
A história oferece poucos exemplos de federações políticas bem-sucedidas. No momento da sua federação, na década de 1780, os Estados Unidos eram um punhado de jovens Estados escassamente povoados com uma cultura e uma língua em comum, pelo que não oferece muitas lições relevantes para a Europa de hoje. Já a experiência da Suíça é mais produtiva, nomeadamente em termos de gestação lenta. “Federar requer tempo”, considera o ex-diplomata suíço Jakob Kellenberger. “Demorou séculos para as pessoas que vivem nos cantões suíços se conhecerem umas às outras, houve um longo período de confederação antes de se dar o passo para a federação integral, em 1848.”
A federação suíça tem funcionado, segundo ele, porque o centro tem sido respeitador da autonomia dos cantões (que nunca se manifestaram ansiosos por abdicar da sua autoridade) e tem tido cuidado para não abusar dos seus poderes. Assim, todos os poderes não especificamente delegados no governo federal pela Constituição Helvética continuam a ser assumidos pelos cantões. Com décadas de uma integração realizada a pequenos passos por trás de si e um mundo em aceleração pela frente, a Europa tem de dar o salto para uma união política, dentro de anos ou décadas, não séculos, e essa mudança pode ganhar muito se seguir em grande parte o modelo suíço. [...] Por outras palavras, como a Suíça, a Europa precisa de um governo central, forte mas limitado, que acomode a maior diversidade local possível.
Apesar de uma Europa federal ter de ser aberta a todos os Estados-membros da União Europeia, a atitude de atirar-se para a frente não deve ser bloqueada porque alguns ainda não estão dispostos a fazê-lo, tal como não deve ser imposta de cima. A opinião pública democrática de cada Estado terá que decidir se é do seu interesse a longo prazo juntar-se à federação ou optar por sair. É uma ilusão acreditar que uma união política forte possa ser construída sobre acordos fracos que resultam em tratados titubeantes. A sua fundação tem de ter um mandato popular.
Um compromisso centrista
O local apropriado para estes debates seria uma convenção europeia aberta a todos os países. O ex-primeiro-ministro belga Guy Verhofstadt e o político alemão Daniel Cohn-Bendit (ambos membros do Parlamento Europeu), entre outros, propuseram transformar as eleições para o Parlamento Europeu de 2014 numa eleição para uma Assembleia Constituinte que redija uma nova Constituição para a Europa, incorporando este tipo de ideias.
Especificamente, como pode uma união política funcionar na Europa? O Parlamento Europeu poderia eleger o presidente-executivo da Comissão Europeia, que formaria um gabinete ministerial saído dos grandes partidos com assento no Parlamento – incluindo um ministro das Finanças com capacidade para cobrar impostos e formular um orçamento substancial sobre a Europa de base ampla. O foco de um ministro das Finanças seria a coordenação macroeconómica, e não a gestão microeconómica.
Outros cargos ministeriais cobririam áreas supranacionais de alguns domínios europeus (defesa, política externa, energia, infraestruturas, entre outros), deixando, sempre que possível, as decisões sobre outros assuntos nas mãos dos governos nacionais no âmbito da federação. O Tribunal de Justiça Europeu arbitraria quaisquer questões de soberania em litígio entre a Comissão e os Estados-membros.
Na seleção de um executivo para a União, porque o Parlamento teria maior poder, faria sentido ter eleições parlamentares de toda a Europa, em vez de listas partidárias nacionais. Aumentar o que está em jogo nas eleições levaria a uma maior discussão e maiores taxas de votação, o que significaria mais legitimidade para os resultados e para as instituições em geral.
Os partidos que obtivessem menos de 10 ou 15% dos votos em eleições de âmbito europeu participariam dos debates, mas não poderiam votar. Essa regra tenderia a empurrar a política para um compromisso centrista e evitar impasses resultantes de um poder de veto por pequenos partidos numa coligação.
Questões espinhosas
Neste esquema, o atual Conselho Europeu seria transformado na câmara alta do poder legislativo da União. Os membros seriam selecionados pelos Estados-nação para mandatos mais longos do que o ciclo eleitoral da câmara baixa do parlamento, incentivando, assim, uma perspetiva de longo prazo em matéria de governação. Ao contrário da câmara baixa, que se concentraria principalmente sobre os interesses de curto prazo dos seus componentes nacionais, a câmara alta seria um corpo deliberativo mais centrado em questões mais vastas e de longo prazo. A representação deveria basear-se num sistema proporcional, de acordo com a população dos Estados-membros.
A fim de preservar um pouco da qualidade meritocrática apartidária da comissão atual, cada ministro na comissão teria um secretário permanente destacado de entre os funcionários públicos europeus da sua área de competência. Como num ideal “sistema de Westminster”, a formulação do orçamento seria da competência da comissão e não do parlamento. Esse orçamento seria apresentado para votação de braço no ar no Parlamento. Um voto de “não confiança construtiva” pelo Parlamento pode rejeitar a orientação política definida pela Comissão. Nesse caso, seria formado novo governo. (O voto de “não confiança construtiva” é um mecanismo de consenso em que um voto de não-confiança só pode ser apresentado se já estiver assegurado o apoio da maioria para uma nova coligação de governação.) Impostos e legislação teriam de ser aprovados por uma maioria de ambas as câmaras legislativas.
Qualquer passo na direção de uma união política levanta obviamente incontáveis questões espinhosas. As novas instituições e as suas regras seriam idealmente estabelecidas de baixo para cima, numa assembleia constituinte, e não por uma mudança instituída por tratado – mas como pode um processo verdadeiramente sedimentado ganhar ímpeto? Os grandes partidos, com a maioria dos lugares no Parlamento Europeu, precisariam de assinar um compromisso ou um programa comum suficientemente robusto para tornar possível a governação. Mas e se não o fizerem? E, mais importante, poderia uma união política exercer uma política se não fosse precedida de uma construção nacional a nível de todo o continente, destinada a forjar uma identidade comum para o futuro? No entanto, o que é crucial agora é o reconhecimento de que o sistema atual não está a resultar e que uma integração mais próxima é a opção mais sensata e atraente.
A única maneira de responder ao atual desafio da Europa, perante o grande leque de incertezas, é a concretização do compromisso dos dirigentes europeus e seus concidadãos com essa transformação, em vez de se manterem paralisados pela hesitação.

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