Quer se trate de expressar a sua posição comum sobre o conflito sírio ou de defender as suas conquistas no domínio das novas tecnologias, a Europa parece incapaz de reagir aos desafios que o mundo lhe lança. Ainda será capaz de uma guinada?
Ao mesmo tempo, a Europa, que viu nascer a tecnologia GSM que domina os telefones móveis mundiais, vê a Nokia, o último grande produtor europeu de smartphones, ser comprada pela americana Microsoft.
O velho continente perdeu a batalha da inovação em proveito dos Estados Unidos, mas também com benefício de novos atores como a Coreia do Sul e a China. A Europa está condenada a ser apenas um enorme mercado de consumidores depois de ter sonhado ser uma das potências criadoras do mundo de amanhã?
Toda a gente conhece a famosa frase atribuída a Henry Kissinger: “A Europa? Qual é o número de telefone?” A crise síria demonstra que essa piada maldosa continua atual, apesar das ambições dos europeus de dotarem a sua União com uma “política externa e de segurança comum”. Os 28 não conseguiram fazer-se ouvir a uma só voz durante toda esta surpreendente crise desencadeada pelo massacre com armas químicas em Al Ghouta. A França e o Reino Unidos tomaram posições dianteiras (até ao voto da Câmara dos Comuns que obrigou David Cameron a retirar-se do projeto de retaliação militar) sem esperarem pelos outros 26 países.
Inação da diplomacia francesa
Ao ponto de, ao chegar ao G20 de São Petersburgo, o presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy, de cuja existência nos esquecemos frequentemente, começou por… se afastar da posição francesa, muito isolada.
Foi necessária a reunião dos 28 ministros dos Negócios Estrangeiros, em Vilnius, após o G20, em que participou o secretário de Estado norte-americano John Kerry, para que, finalmente, Catherine Ashton, a chefe da diplomacia europeia, de cuja existência também nos esquecemos frequentemente, expressasse uma posição de princípios firme, condenando o uso de armas químicas.
Isto é, sem dúvida, fruto de uma espantosa inação da diplomacia francesa que, de facto, nada fez para mobilizar o apoio dos europeus; e do facto de a Alemanha estar em plena campanha eleitoral, o que explica que tenha levado tanto tempo a tomar uma posição clara.
Mas é sobretudo a permanente fraqueza da Europa que está em causa, mesmo antes da última crise síria. A criação de um aparelho diplomático europeu em virtude das novas instituições, dirigido pelo muito profissional diplomata francês Pierre Vimont, não foi suficiente para acordar um animal político fossilizado antes mesmo de ter dado provas.
É uma das grandes informações económicas do final deste verão: a Microsoft comprou a área de telefones móveis da finlandesa Nokia, o último grande produtor de telemóveis da Europa. Depois da francesa Alcatel, da alemã Siemens e da sueca Ericsson terem atirado a toalha ao chão, é agora a vez de a Nokia passar a ter bandeira norte-americana, depois de ter reinado durante vários anos no planeta das telecomunicações. No espaço de alguns anos, o universo dos telefones móveis mudou completamente de fisionomia, sem que os europeus tenham compreendido o que lhes estava a acontecer.
Inovação e criatividade tecnológica
Os europeus, com o seu sistema GSM de segunda geração, controlavam 80% do mercado mundial, mas o aparecimento dos smartphones mudou as regras do jogo. Os reis do setor chamam-se agora Samsung, Apple, Google, e progressivamente marcas chinesas como Huawei, ZTE ou Xiaomi, ou de Taiwan, como a HTC. Estados Unidos, Coreia do Sul e China: este trio marginalizou completamente os europeus num setor chave da inovação tecnológica. Os europeus ainda estão presentes no equipamento de redes (Alcatel, Siemens, Ericsson, Nokia...) e os mercados fervilham de rumores sobre fusões entre as empresas em dificuldades.
O naufrágio é preocupante para a capacidade da Europa em continuar a ser uma terra de inovação e de criatividade tecnológica, para além da Airbus e de alguns outros, raríssimos, sucessos. E não apenas um enorme mercado de consumidores cativos e viciados em máquinas concebidas e fabricadas por outros.
A Europa conseguirá recuperar ou está condenada a continuar a ser um enorme mercado, tal como desejam aqueles que, como os britânicos, nunca aderiram ao projeto de uma união política que entusiasma muitos europeus desde há meio século?
A crise financeira dos últimos anos minou a solidariedade e a vontade política comum dos agora 28 países (desde a adesão da Croácia, a 1 de julho), cedendo progressivamente lugar à apatia, no melhor dos casos, e ao aumento dos populismos e dos nacionalismos, nos piores.
Europa incapaz de formular projeto comum
Se os líderes europeus conseguiram evitar o pior durante a tempestade da zona euro, não deram, no entanto, aos seus povos uma prova da pertinência do projeto europeu. Pelo contrário, esse projeto tem de enfrentar o ceticismo e a rejeição crescentes, por ausência de verdadeiras razões para que se acredite nele.
A garantia da paz, que foi o motor dos pais fundadores após a II Guerra Mundial, não chega para obter apoio, apesar de – e a forte imagem de Oradour-sur-Glane, na semana passada, recorda-o – o peso da História não poder ser apagado com um gesto de mão.
Mas esta Europa que fez a paz dentro de si própria não é hoje capaz de ter peso no incêndio que se desencadeou à sua porta, nessa Síria martirizada pela guerra; mais ainda, não é capaz de formular um novo projeto comum para os seus cidadãos.
Este projeto comum pode ainda ser formulado por uma França em má situação económica e moral, por uma Alemanha superpoderosa mas fria, e por alguns outros como a Polónia, principal história de sucesso dos novos membros?
Os líderes europeus têm uma janela de oportunidade para uma guinada coletiva, entre as eleições alemãs do final de setembro e as eleições europeias da próxima primavera, que se anunciam calamitosas. Mas a análise objetiva do estado da Europa, e dos seus líderes atuais, deixa-nos grandes dúvidas.
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