Um dos passos é a reforma do Estado, que tem que se fazer “sob o signo da equidade”, entre o sector público e o sector privado e entre gerações, fez questão de realçar Poiares Maduro, numa referência clara às recentes decisões do Tribunal Constitucional.
Ontem, contudo, o governante lançou algumas mensagens que mais facilmente (e sem surpresa) se ouviriam da boca de um gestor descontente, de um empresário desencantado ou mesmo de um líder de oposição do que de um ministro da Economia. Em resumo, ficaram 3 recados. Primeiro: a consolidação de um ciclo económico virtuoso em Portugal não é sustentável com uma fiscalidade tão agressiva. Segundo: as empresas estão a fazer o seu trabalho e as famílias fizeram o ajustamento, por isso é chegado o momento de o Estado fazer a sua parte no esforço colectivo. E, por fim, sugere que o Governo dê sinais fiscais mais positivos aos portugueses.
Pires de Lima sabe bem do que fala. Até há precisamente 50 dias, liderava uma grande empresa nacional e, através dela, lidava directamente com um mercado paralisado pela crise e pela fuga de consumidores e cercado por uma carga fiscal asfixiante. Por isso, tudo o que disse ontem faz sentido e deve ser levado a sério. Só que Pires de Lima já não é gestor de uma empresa privada, é ministro.
O que disse ontem é precisamente o que empresários e trabalhadores exigem e necessitam. E é precisamente aquilo que se espera que um Governo consiga fazer: reduzir impostos, facilitar a vida de empresas e trabalhadores e abrir caminho à recuperação económica. Ou será que, por momentos, Pires de Lima se esqueceu que é ministro da Economia e que tudo aquilo que ontem reclamou é aquilo que hoje está (também) nas suas mãos tornar uma realidade?
Não é só de um ministro que se espera coerência nas políticas e no discurso, é de todo o Governo. Pires de Lima não pode surgir a defender menos impostos e, no mesmo dia, outro ministro, como foi o caso de Miguel Poiares Maduro, ameaçar com novo aumento da carga fiscal se a reforma do Estado não tiver os efeitos pretendidos.
Ou será que um estaria a pensar em baixar os impostos sobre os lucros de bancos e empresas e o outro a ponderar um agravamento fiscal sobre os rendimentos do trabalho e das pensões? Assim, em boa verdade, já não haveria incoerência - talvez, e apenas, uma grande dose de injustiça.
Esta espécie de bipolaridade governativa - e que ontem se manifestou de novo, com o vice-primeiro ministro a prenunciar uma meta de défice mais flexível e o primeiro-ministro a não querer comprometer-se com isso - não é uma boa política. Por um lado, revela muito de como anda o consenso governamental por estes dias. Por outro, confunde um país que, mais do nunca, precisa de um rumo, não que lhe exibam o mapa do labirinto em que estão metidos.
O antigo ministro das Finanças, Bagão Félix, apontou baterias ao Executivo de Pedro Passos Coelho, não economizando palavras para criticar a convergência entre o sector público e o sector privado, bem como a reforma do Estado que, a seu ver, está a ser feita “à custa dos outros”. O também conselheiro de Estado falava ontem à noite na antena da SIC Notícias.
“As palavras equidade e convergência têm sido gastas e usadas para todos os gostos, em meu entender, erradamente”, começou por observar o antigo responsável pela pasta das Finanças, Bagão Félix, que falava ontem na SIC Notícias.
Não poupando farpas ao Governo liderado por Pedro Passos Coelho, o também conselheiro de Estado foi mais longe e assinalou: “Equidade e convergência são uma treta”.
O governante reportava-se à convergência entre o regime do sector público com o do sector privado que o Executivo pretende levar a cabo.
Ao mesmo tempo, Bagão Félix criticou, “reformar o Estado à custa dos outros não custa nada, entre aspas, custa muito, mas não é esta a verdadeira reforma do Estado”, acrescentando que depois de um “confisco fiscal”, o Governo está a aplicar agora um “confisco social”.
Desta feita, concluiu o ex-governante, a posição adoptada pelo Executivo “parece-me de uma grande insensibilidade e de um puro orçamentismo”.
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