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sábado, 20 de julho de 2013

Uma barragem aos Direitos Humanos por 3 Gargantas?

O residente de Macau com nacionalidade portuguesa que, em 2009, foi condenado à morte no Continente já foi executado. A notícia chegou através do irmão de Lau Fat-wai. A Amnistia Internacional (AI) em Portugal, a voz mais activa pela suspensão da pena, lança duras críticas à falta de empenho de Durão Barroso, Cavaco Silva e José Sócrates. Macau também nunca deu resposta.
Pedro Galinha e Inês Santinhos Gonçalves
Lau Fat-wai, o residente de Macau com nacionalidade portuguesa que em 2009 foi condenado à morte no Continente, já foi executado. A informação foi cedida à AI de Hong Kong pelo irmão de Lau e confirmada junto da família.
O homem de 53 anos foi condenado em Cantão por transporte de droga, posse ilegal de arma e contrabando de materiais para fabrico de estupefacientes. Desde a detenção, em 2006, que a família deixou de ter qualquer contacto com ele, não sabendo sequer em que estabelecimento prisional estava detido. Após a condenação, em 2009, a AI começou uma campanha para travar a execução de Lau, sem sucesso. Esta semana, mais de um ano passado desde as últimas notícias sobre o caso, a AI de Hong Kong voltou a contactar a família, como é habitual em todas as acções urgentes que lançam. Foi com esse contacto que a organização de defesa de direitos humanos soube, através do irmão, que Lau já tinha sido executado em Fevereiro deste ano.
Contactada a família de Lau Fat-wai confirmou a notícia da execução mas não quis fazer mais comentários.
A secção para a Ásia-Pacífico da Amnistia Internacional, sedeada em Londres, lembra os números elevados de aplicações da pena capital na China: “A execução de Lau Fat-wai é, tal como muitas outras execuções, extremamente lamentável. Há uma dose considerável de segredo em torno da pena de morte na China, mas é muito provável que o país execute milhares de pessoas todos os anos. É mais do que todo o resto do mundo junto, são números chocantes”. A organização manifesta “grandes preocupações” sobre o sistema judicial chinês e acredita que ainda há casos de “provas extraídas através de tortura” a serem usadas nos tribunais do Continente.
O caso foi também acompanhado em Macau. Em Janeiro do ano passado, chamado a comentar o andamento do processo, o cônsul-geral de Portugal, na altura Manuel Cansado de Carvalho, disse apenas que o caso “não se passa em Macau”, remetendo qualquer esclarecimento adicional para o Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Em Fevereiro, a presidente da Assembleia da República Portuguesa emitiu um comunicado em que se manifestava contra a execução de Lau Fat-wai. No mesmo mês, Maria Assunção Esteves reuniu-se com o embaixador da China em Portugal, Zhang Beisan, e manifestou-se “optimista” quanto ao desfecho do caso.
Contactada a Embaixada de Portugal em Pequim, não foi possível obter uma reacção até ao fecho desta edição.
A ajuda de Macau
Lau foi acompanhado por um advogado de Cantão, do escritório Jin Ling. Em Macau, Vasco Passeira, tentou ajudar. Quando era ainda advogado estagiário, em 2009, foi contactado pela ex-mulher de Lau, que tinha à sua guarda o filho menor dos dois. Entregou-lhe a sentença em chinês e pediu-lhe auxílio. “Era estagiário e foi uma situação que me deixou muito triste. É uma notícia muito triste que me está a dar”, reage. Entretanto, o contacto com a ex-mulher de Lau perdeu-se. “Ainda tentámos entrar em contacto com ela mas o número deixou de funcionar”, conta Passeira.
Apelos sem fruto
Lau nasceu em Cantão em 1960, mas foi, já na adolescência, adoptado por uma família chinesa de Macau – a mãe tinha também nacionalidade portuguesa. Mudou-se para o território na década de 1980 e depois de uma época desempregado começou a trabalhar no Casino Lisboa. Mais tarde casou, teve um filho e divorciou-se – filho e ex-mulher têm também passaporte português.
De acordo com testemunhos dos irmãos, em 2006 Lau não passava a fronteira para a China há quase um ano. Fê-lo para entregar uma encomenda a alguém com quem tinha uma dívida, contam. Apesar de não se saber ao certo o que transportava, terá sido detido na posse de estupefacientes.
Em Junho do ano passado, o irmão de Lau, a viver em Macau, falou ao jornal Público sobre o silêncio absoluto que se estabeleceu desde a detenção: “Há 7 anos que não o vemos nem falamos com ele. Lau está num estabelecimento prisional mas não sabemos bem qual ou onde. Só os advogados é que podem entrar em contacto com ele”.
A sentença, confirmada em 2011 por uma instância de recurso, esteve perto de ser executada no início do ano passado, mas faltava a confirmação do Supremo Tribunal Popular. A demora de mais de um ano pode dever-se à pressão diplomática em torno do caso e a interesses chineses em Portugal, sugere a coordenadora da secção China da AI Portugal, Maria Teresa Nogueira. “Acho que foi por alguns destes contactos [oficiais de Portugal] e mais porque os chineses estavam com negócios cá, mas não queriam estragá-los. É costume levarem a água ao seu moinho e fazerem cedências aparentes ou temporárias, mas acabam por fazer o que tinham determinado antes”, argumenta.
A notícia da execução de Lau Fat-wai surpreendeu Maria Teresa Nogueira. A coordenadora do grupo que se encarrega das questões da China, na Amnistia Internacional em Portugal (AIP), não tinha notícias sobre o caso desde o ano passado. Na altura, o Supremo Tribunal Popular chinês estava a rever a sentença do residente de Macau com nacionalidade portuguesa.
“Desde 2009, houve vários contactos feitos com a China no sentido de que não fosse executado e que pudesse haver eventualmente uma comutação da sentença”, começa por explicar a responsável, que lembra o primeiro contacto realizado sobre Lau Fat-wai. O destinatário foi Durão Barroso, que nunca respondeu à carta enviada pela AIP, em Fevereiro de 2009.
O Presidente da República portuguesa, Cavaco Silva, assim como o antigo primeiro-ministro José Sócrates, também foram contactados. Mas a réplica de ambos foi idêntica à do presidente da Comissão Europeia.
“Houve aqui muito descuido”, critica Maria Teresa Nogueira.
Cavaco e Sócrates receberam a missiva em Novembro 2010, por ocasião da visita a Lisboa do antigo Presidente chinês Hu Jintao. “Focámos vários aspectos, mas a questão de Lau Fat-wai ia reforçada. Nessa altura, também fizemos uma manifestação, que até foi desviada, quando tinha sido previamente autorizada. Em vez de nós, estiveram [junto ao local das cerimónias oficiais] os chineses residentes em Portugal”, recorda a activista, que, apesar de tudo, não deixa de destacar o papel do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal. Primeiro, encabeçado por Luís Amado, que efectuou diligências junto das autoridades chineses. Depois, por Paulo Portas.
“Pedimos uma audiência e, em 8 de Fevereiro de 2012, fomos recebidos pelo adjunto do ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Diogo Afonso de Belfort Henriques, e pela chefe de gabinete, que nos detalharam os contactos feitos ao longo do tempo com a embaixada da China em Portugal, com os ministérios dos Negócios Estrangeiros e da Segurança Pública da China e com Supremo Tribunal Popular, através da embaixada portuguesa em Pequim, e com as autoridades chinesas, aquando da visita do anterior ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, à China, em Abril de 2010”, enumera.
Maria Teresa Nogueira frisa ainda que, “na primeira revisão do Código Penal da China, em Fevereiro de 2011, o Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal questionou as autoridades chinesas para saber se as modificações introduzidas poderiam levar à anulação da condenação à morte de Lau Fat-wai”. No entanto, nada alterou o seu destino.
O mediatismo deste caso atinge o ponto mais alto quando a Amnistia Internacional emite uma “Acção Urgente”, em Janeiro de 2012. O apelo feito foi no sentido de endereçar cartas aos presidentes do Supremo Tribunal Popular e do Comité Permanente da Assembleia Popular Nacional, e uma cópia para o Chefe do Executivo de Macau.
Questionada sobre a posição da Região Administrativa Especial de Macau, Maria Teresa Nogueira avança que nunca obteve qualquer feedback. Quanto ao facto de os familiares guardarem silêncio, a responsável refere que “preferem calar-se” porque, neste tipo de situações, “podem ser perseguidos”.
Porque sou visceralmente contra a pena de morte, por razões que já defendi por aqui, mas basicamente porque não entendo o paradoxo de um Estado ter o direito de matar uns, ao mesmo tempo que tem o dever de preservar a vida de outros.
No caso, o nojo aumenta por ser um cidadão português, condenado à morte e executado por um outro país, que tem relações comerciais, económicas e financeiras com Portugal, circunstâncias que serviram para fintar os esforços dos serviços diplomáticos portugueses e algumas figuras da hierarquia nacional. Foram só Gargantas!
Fica o registo do crime (do Estado chinês) para que se saiba, e a história descuidada (com alguns protagonistas), que terminou na morte de um português “descolonizado”, deslocalizado e só…
E insisto: É pena, que ainda haja Estados com PENA de MORTE (no Século XXI)!

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