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terça-feira, 28 de agosto de 2012

Após o fogo posto, Millás explica como vê o mundo

Juan José Millás nasceu em Valência, a 31 de janeiro de 1946, mas é em Madrid que vive desde os 6 anos, onde equilibra a carreira de escritor com a de professor na Escuela de Letras de Madrid e inúmeras colaborações em jornais. É casado, tem 2 filhos, é socialista. Licenciado em Filosofia e Letras, celebrizou-se com obras como El Desorden de Tu NombreLa Soledad Era Esto ou a novela autobiográfica El Mundo, e até criou um estilo literário: os articuentos, um híbrido entre contos e artigos, escritos no telemóvel. Há uma semana publicou no El País o artigo abaixo, que incendiou Espanha.
Vivemos uma crise sem paralelo e sem fim à vista. Como vê o futuro de Espanha e de Portugal?
Vejo-o mal, já que nos tornámos uma colónia da Alemanha e vivemos sob um governo composto por grandes especuladores. Não é a política que influencia a economia mas a economia que determina a política. Como dizem os jovens do 15M [movimento de cidadãos também conhecido como dos indignados, nascido a 15 de março de 2011], "chamam-lhe democracia, mas não é".
Quando esta crise começou, Espanha (como Portugal) era liderada por um governo socialista. Como é que isto aconteceu?
Historicamente, a social-democracia atraiçoa-nos sempre. Está na sua natureza. Depositei muitas esperanças no Governo de Zapatero, mas no fim, de um dia para o outro, ele curvou-se ao poder financeiro. E quando convocou eleições, fez passar uma mensagem subliminar aos eleitores de que só a direita estava contente com o que se passava.
Acredita que os atuais governos, de direita, estão a tomar as piores medidas possíveis? Um governo de esquerda faria melhor?
Os governos de direita estão a fazer aquilo que sempre quiseram fazer, legitimando as decisões com a ideia de que tudo lhes é imposto de fora. "Não tenho liberdade de escolha", disse há dias [o primeiro-ministro espanhol] Mariano Rajoy, perante o Parlamento. E ninguém lhe pediu imediatamente que se demitisse, porque a esquerda ficou muda.
É sensato que países como Espanha ou Portugal se mantenham no euro? Não ficaríamos melhor com pesetas e escudos do que com a moeda única?
Não sei, é uma pergunta demasiado técnica. Parece é que nunca devíamos ter entrado na moeda única.
O euro e as normas europeias são demasiado fortes e rígidos?
Não é essa a questão. A ideia que tínhamos de Europa não era a de um IV Reich. Philip K. Dick escreveu uma novela de ficção científica na qual os alemães tinham ganho a II Guerra Mundial e nos faziam acreditar que a vitória tinha sido nossa. O mundo atual seria o resultado dessa vitória oculta.
Quem, entre os líderes europeus, se tem portado pior nesta crise?
Merkel e Draghi.
O que poderia Merkel ter feito de forma diferente - e os alemães aceitá-lo-iam?
A chanceler alemã devia colaborar na construção de uma Alemanha europeia e não na edificação de uma Europa alemã. Mas, como quase todos os políticos, atua apenas de acordo com critérios quantitativos e de curto prazo.
Acredita que um resgate total a Espanha é inevitável? E os espanhóis estão prontos para aceitá-lo?
Creio que é inevitável. E nós aceitaremos. Não temos capacidade de rebelião, pelo menos que parta dos partidos políticos convencionais.
O seu artigo foi o mais lido de sempre do El País e invadiu as redes sociais. Tornou-se viral mesmo fora de Espanha. Qual a razão do êxito?
Porque aceitei escrever aquilo que muitos pensam.

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