(per)Seguidores

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Revisitando uma visitação ao “Pulo do Lobo”…

Lembro a sua primeira campanha presidencial e a insistência na prova de que Portugal estava a ficar para trás: até a República Checa nos tinha ultrapassado. E tinha. Nos rankings de competitividade internacional, a economia portuguesa evoluía ano após ano num sentido só. Para baixo.
Sérgio Figueiredo
Cavaco Silva, o homem providencial, economista experiente e preparado, o candidato, até podia cavalgar a crise para ganhar votos populares. Cavaco Silva, o Presidente, não podia fazer isso. E não cavalgou, preferiu desaparecer no meio dela. Da crise e entre mandatos.
Ninguém, portanto, se lembrou do Chefe de Estado na semana em que Portugal subiu 15 lugares na tabela das economias mais competitivas do mundo. Só eu, por causa desta memória maldita e dos checos. Ranking de 2014: Portugal em 37, a República Checa de novo atrás de nós, Cavaco nos "erros e omissões".
Os rankings de competitividade vivem mais de percepções do que de estatísticas. Não é coisa pouca, porque resultam da visão de milhares de gestores e empresários sobre as economias do mundo, neste caso mais de 140. É, então, da nossa reputação externa que estamos a falar. E aquilo que se ouve é tão formidável quanto surpreendente, tão agradável quanto inesperado. É uma credibilidade que se revela "no ambicioso programa de reformas que o país tem adoptado" e que, no entender dos senhores que organizam o influente Fórum de Davos, "parece estar a começar a dar frutos em todos os domínios".
Aquilo que o Fórum Económico Mundial escreve a partir de Genebra é um exercício de leitura obrigatória e recomendável para qualquer português interessado. Porque começa na economia e empresas e acaba na psicanálise.
As nossas reformas que os outros valorizam não podem ser na Segurança Social (que Passos Coelho enterrou num comício) e no Estado - porque é um guião que Paulo Portas enfiou numa gaveta etiquetada "aqui jaz o socialismo do Dr. Soares".
O funcionamento das instituições sobe 5 lugares, porque ali não está ainda o embaraço de reguladores e poder judicial na falência fraudulenta do BES e do grupo económico que nele se entrelaçava.
E onde cabem o mal-estar de tantos grupos profissionais ou a asfixia das universidades num país que é o 24º nos indicadores "educação superior e formação" e "saúde e ensino básico"? Como lamentar esta taxa de desemprego historicamente elevada se, na "eficiência do mercado laboral", Portugal sobe mais de 40 lugares?
Se a televisão é um espelho da sociedade, então é porque os decisores internacionais não sintonizam a RTP Internacional. Só assim acreditam que o país "pode tirar melhor proveito da sua mão-de-obra altamente qualificada" e classificam-nos em 29º lugar no critério - é por não verem as reportagens no aeroporto de Lisboa, com jovens licenciados a emigrar com lamentos e lágrimas no rosto.
Impossível dar este salto de gazela, num ano, logo no último ano!, se a verdade toda estivesse nos gráficos do Dr. Medina Carreira ou na desgraça profetizada por Pacheco Pereira em jornais e revistas. Impossível, no país que vemos e lemos, ser esta uma das 40 economias mais competitivas do mundo...
Mas é aqui que, subitamente, estamos. Não bate certo, mas sabe bem. 3 explicações são possíveis, mas só uma conclusão é necessária.
Uma, que desqualifica o ranking e o Fórum Económico Mundial. Nesta não podem falar os que, durante estes anos, se agarraram a esta tabela para exibir o declínio português. É uma tentativa, mas pouco convincente, porque Portugal tem igualmente melhorado noutras classificações semelhantes, como a que a escola de negócios IMD divulgou na última Primavera.
A outra desqualifica os próprios portugueses. Afinal a economia está mais competitiva graças às reformas impostas pela troika. Sucede que a Grécia não aparece entre os primeiros 50, a Itália não foi intervencionada e tem pior classificação que a nossa e, além da República Checa, Portugal ultrapassou a Polónia e praticamente toda a Europa de Leste - a tal que, depois do alargamento da União Europeia, nos iria condenar para um ciclo irremediável e contínuo de perda na competição internacional.
Portugal está hoje numa situação mais favorável do que estava antes da crise financeira de 2007. Não no ambiente macroeconómico - que até piora para uma sofrível 128ª posição. Mas numa outra série de indicadores, que vão desde pessoas mais preparadas, empresas mais inovadoras, mercados mais eficientes, negócios mais sofisticados, nos sistemas públicos de ensino e de prestação de cuidados de saúde.
É a 3.ª explicação possível: entre a realidade e os portugueses, há uma intermediação que forma uma agenda incompleta, que confunde "opinião pública" com "opinião publicada", que dá voz aos "representantes" e ignora os "representativos". E esta explicação não abona nada a favor da comunicação social.
Em qualquer dos casos, é muito boa a sensação de, através das opiniões externas, aos olhos dos outros, ver Portugal aproximar-se dos primeiros. Olhar cada vez mais próximo, para os que lá estão em cima, deveria obrigar-nos a mudar de raciocínio. Convergir para a média é a ambição dos medíocres. Chegar ao "top 10" é a única forma de recuperar o atraso.
Desde que entrámos na CEE, queremos atingir a média: a média europeia, o PIB "per capita" médio, a média dos outros e o resultado não tem sido espectacular: 1 passo à frente, 2 passos atrás. Sempre que demos um salto, que não fizemos o que todos estavam a fazer, Portugal chegou à vanguarda. Vários exemplos o confirmam, da fibra ótica às energias renováveis.
Portanto, sobre rankings e competitividade, escolha você mesmo 1 dos 3 cenários, porque prefiro uma conclusão: nada de passos, só saltos!
"O único país que progride, apesar de não ser suficiente" para absorver a bolsa de desempregados "é a Espanha", afirmou a diretora do FMI, Christine Lagarde, em entrevista.
Questionada se considera que a França está a atrasar-se na aplicação de reformas, a diretora do FMI insistiu que "há que as por em prática e não apenas ficar contente em falar delas", numa mensagem que serve para "o conjunto da zona euro e não apenas para a França".
E porque estes rankings de competitividade vivem mais de perceções do que de estatísticas, mais baseadas na "opinião publicada", que dá voz aos "representantes" da classe dirigente, do que na "opinião pública" onde está a maioria dos "representados", tem o valor que tem e não pode contrariar a realidade, que se traduz no mais recente e paradoxo paradigma: “O país está mais rico (?), mas os cidadãos estão mais pobres”.
Para contrariar as perceções e valorizar as estatísticas (?), a conclusão de Lagarde obriga-nos a optar por uma 4.ª explicação, de cariz espiritual, que é, mais uma vez, ter acontecido um milagre…
O pior, é que de milagre em milagre, nunca mais saímos deste inferno, embora possamos passar pelo Purgatório, durante o período pré-eleitoral…

Sem comentários:

Enviar um comentário