Europa, economia, dívida pública, défice, deflação. Ministros e Paulo Portas muito em especial. Os tormentos da mulher que manda no país.
António Ribeiro Ferreira
Os ministros crescidinhos
Sintomática foi a sua resposta a um participante na Universidade de Verão do PSD sobre se era mais difícil negociar as mesadas dos filhos ou os orçamentos dos vários ministérios. Maria Luís admitiu que ia ter problemas em casa se os filhos estivessem a ver televisão porque nunca lhes tinha passado pela cabeça que as mesadas eram negociáveis. Quanto aos ministros, já os conheceu crescidinhos, não teve oportunidade de os educar. Os ministros, as manobras de Paulo Portas, seu superior hierárquico no governo, em torno dos impostos, mas também a Europa estagnada, cheia de sobressaltos, a economia portuguesa a rastejar, com poucos altos e muitos baixos, a maldita dívida que não para de subir e que Maria Luís admite pela 1.ª vez discutir no parlamento, são pesadelos diários da ministra das Finanças.
O quebra-cabeças da dívida
7 noites, 7 pesadelos. E, se a dívida é um quebra-cabeças, já vai nos 134% do PIB, o défice é um exercício de malabarismo em que tudo ou quase tudo corre mal. É verdade que as receitas fiscais estão imparáveis, só este ano vão chegar aos 37.000 milhões de euros, mas a despesa até final de Julho, sem reposições de salários e pagamento de juros, subiu 617 milhões de euros.
Monstro insaciável
Um sinal claro de que o célebre monstro criado em 1989 por Cavaco Silva continua insaciável, indiferente à troika, à austeridade. Um sinal claro também da impotência dos ministros para imporem disciplina nas contas dos seus serviços. Ministros que Maria Luís já apanhou crescidinhos, mal-educados em matéria de contenção de despesas e que imaginam que os seus orçamentos são negociáveis. Talvez Maria Luís não use o "não há dinheiro" de Vítor Gaspar para os calar. Mas deve fitá-los bem de frente, olhos nos olhos, e recordar-lhes que o ajustamento deveria ser feito pelo lado da despesa e não pelo lado da receita. E lembrar-lhes que o défice de 2015 está fixado nos 2,5% e o de 2014 já sofreu tantos tratos de polé que pode ir de 4% a 10% com a tragédia dos 3.900 milhões injectados no Novo Banco e outros buracos nas empresas de transportes e nos hospitais. E como mais défice equivale a mais dívida e mais dívida implica o pagamento de mais juros, Maria Luís Albuquerque vive o pesadelo da inflação, negativa há 7 meses consecutivos. Com a deflação à porta, a dívida não desce, antes sobe, afasta os investidores, esmaga os preços das empresas, leva muitas à falência e pode fazer disparar o desemprego.
De olho em Portas
Mas a ministra das Finanças, no meio de tantos trabalhos forçados, ainda tem que andar atrás ou à frente da agenda sempre imprevisível do vice-primeiro-ministro, Paulo Portas. Com o líder do CDS não se trata de discutir orçamentos. Com Portas trata-se de corrigir rotas, deitar água na fervura dos impostos e lembrar que mesmo sem a troika em avaliações trimestrais o caminho da austeridade continua e que não há folgas para baixar impostos quando o país tem défices excessivos.
Em plena discussão do Orçamento do Estado para 2015, Paulo Portas, e o CDS, acena com uma baixa, mesmo que ligeira, da carga fiscal sobre as famílias à boleia da reforma do IRS que está em fase de discussão pública. Mas Maria Luís Albuquerque não vai atrás dos cantos das sereias centristas e mantém-se firme. Em 2015, e sabe-se lá no futuro mais próximo, não há margem para baixar impostos às pessoas. O ajustamento orçamental feito à base das receitas veio para ficar. A não ser que os senhores ministros consigam dominar o monstro que está em todo o lado. Mas Maria Luís não acredita muito na boa vontade dos colegas. Por isso mesmo, dura como é, cortou muitas das despesas que os ministérios iam fazer até final do ano. Sem negociações. Como não negoceia as mesadas dos filhos.
As noites da ministra. Os Pesadelos um a um
Para Maria Luís Albuquerque não há um dia de descanso. Acorda segunda com a Europa e deita-se domingo a pensar em Paulo Portas
1 - Europa
A zona euro e a União Europeia não estão a ajudar nada os países mais pobres e que foram sujeitos a violentos programas de austeridade. Os países mais ricos estão estagnados ou em recessão, como a França e a Itália, e mesmo a poderosa Alemanha caiu 0,2% no 2.º trimestre. Perante esta triste realidade, Maria Luís tem de usar a tesoura para garantir que as contas nacionais não se afundam ainda mais.
2 - Economia
O governo começou por admitir um crescimento de 0,8% no Orçamento do Estado de 2014. Mais tarde, quando apresentou o Documento de Estratégia Orçamental, esse valor foi revisto em alta para 1,2%. Agora, quando apresentou o 2.º Orçamento Rectificativo do ano, voltou a rever em baixa o crescimento em 2014 para 1%. E a montanha-russa pode não ficar por aqui até final do ano. Um quebra-cabeças.
3 - Dívida pública
Sobe, sobe, sem parar. Sobe tanto que a ministra das Finanças admitiu pela 1.ª vez discutir o assunto no parlamento. E isto porque o Tratado Orçamental exige uma quebra de 5% ao ano e para isso Portugal terá de ter saldos primários de 4% e crescimentos nominais do PIB de 4% ao ano. Uma ficção.
4 - Deflação
É verdade que o país não está oficialmente em deflação. Mas com uma inflação negativa há 7 meses, Maria Luís vê a dívida subir e o investimento a cair, a economia a subir menos e o desemprego em risco de aumentar. Com a ministra impotente para inverter a situação.
5 - Défice
O objectivo para este ano era baixar o défice para 4%. Mas os 3.900 milhões injectados no Novo Banco, em empresas de transportes e hospitais e uma subida da despesa do Estado, sem reposições de salários e pagamento de juros, em 617 milhões de euros, podem fazê-lo disparar até aos 10%. Um enorme pesadelo para a ministra.
6 - Ministros
Maria Luís Albuquerque também tem humor. Na Universidade de Verão do PSD lembrou que as mesadas dos filhos não são negociáveis e que já conheceu os ministros crescidinhos para os educar da mesma maneira. Foi por isso que impôs cortes já este ano e que na discussão do Orçamento do Estado para 2015 vai com certeza lembrar aos seus colegas de governo que o défice de 2,5% não é negociável. Como as mesadas dos filhos.
7 - Paulo Portas
Em Julho de 2013 a demissão irrevogável do ministro dos Negócios Estrangeiros por causa da subida de Maria Luís a ministra das Finanças promoveu-o a vice-primeiro--ministro encarregado de discutir com a troika. A ministra das Finanças não dorme a pensar nas jogadas e manobras do líder do CDS. A última, em curso, tem a ver com a baixa da carga fiscal das famílias. Uma utopia que Maria Luís tem travado com muita paciência e diplomacia.
Como se vê, nenhum dos problemas que Maria Luís enfrenta (Europa, economia, dívida pública, deflação, défice, ministros e Paulo Portas) diz respeito aos cidadãos, embora qualquer solução que ela venha a encontrar vá sempre de encontro aos cidadãos. Daí que não se entenda por que terá insónias, se o método terapêutico é sempre o mesmo…
Se é a mulher que manda no país, que mande, nos ministros e no Portas!Se é a técnica competente, que encontre as respostas técnicas e socialmente justas para os problemas da economia, da dívida pública, da deflação e do défice!
Se é a política emergente no PSD, que se imponha na Europa perante os seus pares, técnica, social e politicamente!
Já toda a gente sabe que o procedimento terapêutico será sempre o mesmo que até agora tem sido administrado: sorrir nas fotografias com o Paulo, espalhar charme nas reuniões do Ecofin, dominado por homens e ir ao bolso dos contribuintes…
Por que haveria de ter insónias? Só por causa disto?
E está com sorte, porque dizem que o número 7 é mágico. Oxalá não lhe acrescentem mais um problema para não ter(mos) o azar de se transformar na Maga Patológica…
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